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A amiga solidão

 

Um belo dia, pela primeira vez na vida, veio à pergunta:

“Você está bem?

Nunca ninguém tinha me perguntado isso. Não com essa intensidade e emoção. Não era um simples: Como você está?

Parei fiquei em silêncio e comecei a me questionar se eu estava bem mesmo e logo um filme começou a passar na minha cabeça.

A fortaleza acabara de ser arrombada e não existia nada pensado ou programado para a defesa contra o inimigo invasor: a solidão.

Quando a noite chega, o trabalho acaba, é hora de voltar para casa.

Lar, doce lar?

Mas o apartamento está escuro, a televisão apagada, notebook desligado e tudo é silêncio. Ninguém para abrir a porta, ninguém à espera.  Eu estou só. Vem a tristeza da solidão… E o que mais eu desejava é não estar em solidão…

Aí percebo que minha tristeza não vem da solidão. Vem das fantasias que surgem na solidão.

Então me veio na memória à lembrança uma jovem que amava a “amiga solidão”: gostava de ficar sozinha, lendo, ouvindo música. Assim, aos sábados, ela se preparava para uma noite de solidão feliz. Mas bastava ela preparar-se para ler que as fantasias apareciam. De um lado, amigas em festas felizes, em meio ao falatório, os risos, os flertes, a cervejinha. De outro lado ela, sozinha naquela sala e com certeza naquela agitação da festa ninguém estava se lembrando dela.  Numa festa feliz, quem se lembraria dela?

E aí a tristeza entrava e ela não mais podia curtir a sua “amiga solidão”. O remédio era sair, encontrar-se com a turma para encontrar a alegria da festa. Escolhia uma roupa, vestia-se, saía, ia para a festa… E quando chegava a festa ela percebia que festas reais não são iguais às festas imaginarias. Era um desencontro, uma impossibilidade de compartilhar as coisas da sua solidão… A noite estava perdida.

Ela gostava de meditar diante de uma chama solitária de uma vela, porque ao contrário das luzes de uma lâmpada elétrica, a luz de uma vela é sempre solitária. A chama de uma vela cria, ao seu redor, um círculo de claridade mansa que se perde nas sombras e o silêncio. Nenhum falatório bobo ou riso fácil para perturbar a verdade da sua alma.

As coisas são sempre os nomes que lhe damos. Se chamarmos a solidão de inimiga, ela será sua inimiga. Mas se a chamarmos de amiga ela será e podemos tirar as alegrias de longas caminhadas, da música e das leituras dos livros que amamos. Eis aí três companheiras maravilhosas!

Assim como numa festa de fim de semana muitos vão caminhar por razões da saúde. Incapazes de caminhar sozinhas, vão aos pares, aos bandos. E vão falando, falando, sem ver o mundo maravilhoso que as cerca. Falam porque não suportariam caminhar sozinhas. E, por isso mesmo, perdem a maior alegria das caminhadas, que é a alegria de estar em comunhão com a natureza. Elas não vêem as árvores, nem as flores, nem as nuvens e nem sentem o vento. Que troca infeliz! Trocam as vozes do silêncio pelo falatório vulgar. Se estivessem a sós com a natureza, em silêncio, sua solidão tornaria possível que elas ouvissem o que a natureza tem a dizer. O estar juntos não quer dizer comunhão. O estar juntos, freqüentemente, é uma forma terrível de solidão, um artifício para evitar o contato conosco mesmos. Da mesma maneira estar numa festa nem sempre é estar junto.

A solidão é minha voz, que me fala com ternura e felicidade. Na solidão amiga é quando eu me conheço, me critico, me acaricio e até me amo. O início da infelicidade humana se encontra na comparação.

A nossa infelicidade com a solidão não se deriva ela, em parte, das comparações? Você compara a cena de você, só, na casa vazia, com a cena (fantasiada) dos outros, em celebrações cheias de risos… Essa comparação é destrutiva porque nasce da inveja. Sofra a dor real da solidão porque a solidão dói. Dói uma dor da qual pode nascer à beleza. Mas não sofra a dor da comparação. Ela não é verdadeira.

Se entregue para as coisas da vida. Você sabe muito bem VIVER SOZINHA!  Agora aprenda a VIVER COM ALGUÉM.

A solidão é uma boa amiga… É muito importante, mas só o que não podemos deixar acontecer… É virar “casamento”.

Eduardo Augusto dos Santos

Paulistano do bairro da Indepedência (Ipiranga-São Paulo), que apesar de manter fortes vínculos com suas origens e convicções sempre foi um apaixonado pelas mudanças como forma de evoluir e crescer como ser humano, daí HORA DE MUDAR.

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Eduardo Augusto dos Santos

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